Bàbá Olóògùn Oògùnládé

A Falando de Axé tem o prazer de entrevistar e homenagear o Bàbá Olóògùn Oògùnládé (Sérgio Borges - Ifágbàmilá Olàifá Odùyémi.

 

Falando de Axé: O senhor poderia nos falar quando e como conheceu o Culto a Òrìsà, como começou sua espiritualidade?

Bàbá Ifágbàmilá Odùyémi Oògùnládé (Sérgio Borges): Àború Àboyè Àbosise, na verdade não existiu um quando, e sim, tudo isso fez parte de um processo natural em minha vida. Fui criado por meus avós e os mesmos eram sacerdotes de religiões de matrizes africanas (Candomblé). O barulho do atabaque sempre me seduziu. Nunca me interessei pela Igreja, pela primeira comunhão ou pela crisma, coisas assim. A espiritualidade afro (e afro-brasileira) esteve presente desde os meus primeiros dias e sempre me fascinou mais que tudo.

 

Falando de Axé: O que levou o senhor a escolher o Èsìn yorùbá/Ìsèse Àgbàyé como religião?

Bàbá Ifágbàmilá Odùyémi Ògùnládé (Sérgio Borges): O que mais me fascina, ao falar sobre tudo isso, é que, simplesmente eu não escolhi isso. Não despertei um belo dia e disso vou ser sacerdote, ou vou me iniciar em Ifá para ampliar os meus horizontes. As coisas simplesmente aconteceram. Passei por um período muito complicado em minha vida, onde uma enfermidade quase me levou a morte, e após inúmeras tentativas frustradas de cura, em tratamentos convencionais e espirituais, acabei viajando à África. Ali encontrei muito mais que a solução de meu problema. Fui me apaixonando pelas pessoas, pela cultura, enfim, por tudo. E uma coisa foi levando a outra.

 

Falando de Axé: A seu ver, de acordo com sua experiência sacerdotal, o que o Èsìn yorùbá (Religião Tradicional Yorùbá) possui, que as outras religiões não possuem?

Bàbá Ifágbàmilá Odùyémi Ògùnládé (Sérgio Borges): Muitas vezes, quando eu começo a falar de nossa religião, sempre faço questão de frisar a importância da vivência da cultura e na sociedade yorùbá, na compreensão e no entendimento do que vem a ser o Èsìn yorùbá.

Você pode comprar milhões de livros, ler dezenas de sites, tirar duzentas mil fotos com Ìrùkèrè nas mãos. Viajar à África, uma, duas ou três vezes ou ate mesmo montar sites com copias de escritos meus em fóruns antigos (rsrsrs). Mais se você não tiver vivenciado tudo aquilo, se não olhar para os yorùbás e se sentir como um deles, ser reconhecido (reconhecimento esse, que nada tem a ver com a compra de certificados) como um deles, você jamais ira compreender o que verdadeiramente vem a ser o Èsìn yorùbá. E sem isso meu amigo, e impossível compreender e passar para os seus o que o Èsìn Yorùbá tem que o difere de todas as outras religiões.

Muitas pessoas veem o Èsìn yorùbá como prática de resultados, outras apenas uma nova opção por serem sacerdotes sem perspectivas e na verdade não conseguem compreender o maravilhoso caminho de vida presente em nossa tradição.

Dentre todas as possibilidades presentes em nossa cultura religiosa, nada e mais belo do que a capacidade de tornar o ser humano através de sua divindade pessoal (Orí) uno com todas as energias da Natureza, energias essas que tem sua verdade expressa nas mais diversas manifestações (os Irúnmolè, Òrìsà), conseguindo assim, muito mais do que lograr uma melhora financeira ou o retorno de um amor perdido, lograr uma vida plena, podendo contemplar todas as manifestações divinas, tendo consciência de sua responsabilidade e também do importante papel que possui na preservação, na manutenção e principalmente da interação com todas as expressões do Sagrado.

E isso meu amigo, em nossa Religião (Èsìn yorùbá/Ìsèse àgbàyé) não se pode copiar, se vivencia ou não.

 

Falando de Axé: O que o senhor tem a dizer sobre o Culto a Òrúnmìlà-Ifá no Brasil nos dias de hoje?

Bàbá Ifágbàmilá Odùyémi Ògùnládé (Sérgio Borges): Infelizmente a resposta mais apropriada seria uma tarja negra. Muitos podem estar se perguntando com que propriedade eu falo isso, não e mesmo. Respondo apenas com a propriedade de ter sido o primeiro sacerdote branco a divulgar o Ifá em nosso país. E exatamente por isso é que a maior vontade que tenho é simplesmente não comentar o que se passa.

O Ifá (Culto à Òrúnmìlà) teve um crescimento desproporcional nos últimos anos, uma coisa que eu sempre temi, porque infelizmente quantidade não significa qualidade e isso tem refletido diretamente na vida de muitas pessoas. A cada dia que passa, surgem mais e mais Bàbálawos, pessoas iniciadas que em sete dias se aventuram a fazer as mais desmedidas loucuras, munidas de um livro e de algumas supostas verdades defendidas por um grupo, que apesar de serem a minoria, vem fazendo um enorme estrago em nossa religião.

Mas acredito na verdade e sei que esse não será o final de algo tão lindo e complexo como o Culto a Òrúnmìlà-Ifá no Brasil.

 

Falando de Axé: O senhor acredita na possibilidade da existência de Bàbálawos Brasileiros e em futuras Egbé Ifá no Brasil?

Bàbá Ifágbàmilá Odùyémi Ògùnládé (Sérgio Borges): Eu já disse isso algumas vezes, e volto a afirmar sem sombra de duvidas que sim, acredito fielmente nisso. Acredito que o mesmo Ifá que existe na Nigéria, pode vir a existir no Brasil, mas para isso se torna necessário que algumas correções sejam feitas.

Primeiro, o constante intercambio que vem sendo feito, só que com a vinda de sacerdotes verdadeiros, para que assim as pessoas estejam sempre em contato com a verdadeira religião yorùbá.

Segundo, uma maior união entre as lideranças verdadeiras de nossa tradição, para que assim possamos vislumbrar um futuro melhor.

Essa união seria útil em muitos aspectos, porque assim preservaríamos o Ifá e também conseguiríamos preservar as pessoas bem intencionadas de muitos aventureiros e dos muitos estragos que vem acontecendo.

A criação de um Conselho Brasileiro ou latino Americano de Ifá, assim como existe em Cuba, conselho esse que deveria ser divido entre os mais variados níveis iniciáticos, aonde o aspirante assim como os membros antigos deveriam ser submetidos a uma entrevista e a um questionário, provando seu conhecimento e capacidade de exercer o sacerdócio a que se propõe.

Garanto a vocês que dos duzentos bàbálawos ou sacerdotes supostamente tradicionais, não mais que dez dariam a cara a participar disso.

Porem seria muito importante na estruturação de nossa religião.

 

Falando de Axé: O que o senhor poderia nos dizer sobre o Culto ao Òrìsà Òsanyìn e sua importância para a Religião Tradicional Yorùbá e seus adeptos?

Bàbá Ifágbàmilá Odùyémi Ògùnládé (Sérgio Borges): Como eu disse a Falando de Axé uma vez em uma matéria sobre Òsanyìn, Òsanyìn é extremamente importante em nossa tradição religiosa. E impossível pensarmos em nossa religião sem pensarmos em Òsanyìn, porque sem as ervas, cascas, raízes e outros elementos da natureza, simplesmente não existiria a Religião Tradicional Yorùbá.

E mais uma vez afirmo tudo começa (Igbèrè - iniciação) e termina (Ìsìnkú - funeral) com Òsanyìn.

Falando de Axé: Fale para nós, sobre seus futuros projetos em relação à Religião Tradicional Iorubá?

Bàbá Ifágbàmilá Odùyémi Ògùnládé (Sérgio Borges): Estou estruturando e trabalhando em algumas coisas e no momento apropriado, a partir de junho de 2012, tudo será divulgado.

 

Falando de Axé: Fale para nós sobre a importância do Mérìndínlógún Ifá (Jogo de Búzios)?

Bàbá Ifágbàmilá Odùyémi Ògùnládé (Sérgio Borges): Acredito que como todo oráculo, desde que bem manipulado, o Mérìndínlógún possui importância fundamental na transmissão dos desejos das divindades e também na correção, preservação e principalmente na compreensão dos diversos problemas presentes no dia a dia dos seres humanos.

É um oráculo impar, que necessita de muito estudo, devida ao fato de o mesmo permitir um dialogo aberto com as divindades, permitindo a negociação e a composição das mais diferentes oferendas, do preparo das medicinas e muito, muito mais.

 

Falando de Axé: Bàbá, o que é uma Iniciação (feitura de santo) e sua real importância, para o senhor?

Bàbá Ifágbàmilá Odùyémi Ògùnládé (Sérgio Borges): Muitas vezes costumo questionar as pessoas sobre a diferença entre uma iniciação e um assentamento.

Na iniciação, buscamos despertar características que se encontram adormecidas na vida do iniciando, criando assim condições para que o mesmo, em contato com a divindade em questão possa vivenciar sua existência de uma maneira plena, e em contato com a verdade presente na manifestação de suas divindades.

Em um assentamento, procuramos equilibrar o destino de uma determinada pessoa, suprindo deficiências energéticas presentes em suas características pessoais.

Porem, diferente do que vemos por ai, iniciação como o próprio nome diz, e apenas o inicio, inicio esse que cria condições para que a pessoa mergulho nos aspectos mais secretos e profundos de uma tradição religiosa. Por exemplo, uma Ifá tite ou Ìtèfá não faz de ninguém um bàbálawo, apenas cria condições para que o mesmo possa vivenciar o dia a dia de uma egbé bàbálawo, para que com o passar dos anos, através do iko ate e do itowobiye, seja reconhecido por seus pares como membro de determinada sociedade, podendo assim exercer com maestria a função a qual se propõe.

 

Falando de Axé: Bàbá deixe uma mensagem para os leitores de nossa revista e para os devotos de Òrìsà.

Bàbá Ifágbàmilá Odùyémi Ògùnládé (Sérgio Borges): Muitas vezes pessoas nos procuram tristes e nos dizem que fizeram isso e aquilo, e que se encontram sem caminho, sem perspectiva, perdidas e que não compreendem como determinado Òrìsà pode ter permitido que tal situação esteja presente em sua vida.

O Òrìsà em si e extremamente sábio, mas infelizmente nossas escolhas, muitas vezes equivocadas nos levam a situações de extrema dificuldade onde muitas vezes não conseguimos enxergar ou vislumbrar um novo horizonte.

Não importa qual caminho tenha te levado ao Òrìsà, ou qual situação você possa estar vivenciando, simplesmente acredite, faça as coisas certas, pelos motivos certos e você vera que no final as coisas irão acontecer da melhor maneira possível, e que embora ninguém possa passar as dificuldades por você, os Òrìsàs sempre nos acompanham e é incrível como no final de algo que parece sem solução, as coisas simplesmente acontecem e sempre a transformação vem nos levando ao melhor caminho, caminho esse que nem sempre e o caminho que escolhemos.

 

Obrigado a todos.